Transcrição integral de dois artigo de Fernanda Câncio no Diário de Notícias. Para memória de fanáticos partidários, desmiolados e outros amnésicos e traidores que continuam a aprovar a corrupção porque é o seu partido. São estes e os jornaleiros coniventes que enganam a população os verdadeiros culpados do estado a que o pais chegou devido ao seu suporte incondicional. Tudo se poderia resumir numa curta frase: Os bandos de cabrões que nos governam e nos desinformam.
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Indecência Certificada
6-7-2012 — Ao contrário do que nos dizem os clássicos infantis, não há em regra moral na história. É assim que podemos assistir, boquiabertos - como anteontem - a um Santana Lopes, na TVI24, a perorar, a propósito do curso de Relvas, sobre deverem ser os políticos julgados pelos seus atos em funções e não por episódios do seu percurso privado (cito de memória), sem que algum dos presentes, de Constança Cunha e Sá a Assis e Rosas, pigarreasse sequer. Que o homem que nas legislativas de 2005 fez insinuações explícitas sobre a orientação sexual do adversário e exigiu a audição do depois primeiro-ministro no Parlamento sobre a respetiva licenciatura possa, sem lhe cair tudo em cima, afetar lições de fineza e elevação é bem elucidativo, não apenas da sua comprovada desvergonha, como da amnésia amoral da audiência.
De vez em quando, porém, a realidade faz-se fábula de La Fontaine. E vemos então alguém como Miguel Relvas, que em abril de 2009 afirmou "se fosse parente do engenheiro Sócrates escondia que era parente dele", acrescentando "depois de ganhar as eleições todos os dias quero que a minha filha tenha orgulho" a, numa audiência parlamentar do caso das secretas, três anos depois, lamentar--se, olhos e voz tremeluzentes, pelo "muito que custa" e "o tão injusto é" ser julgado na praça pública, concluindo: "Todo o cidadão tem direito ao bom nome; [...] tenho família, tenho amigos, tenho uma posição na sociedade..."
Tem Miguel Relvas toda a razão: todo o cidadão tem direito ao bom nome. Até ele, que o negou a outros. Curioso que só se dê disso conta quando é à sua porta que as acusações e insinuações batem, depois de tudo ter feito, como tantos "notáveis" do seu partido, de Santana a Ferreira Leite, de Marques Mendes a Menezes, de Pacheco Pereira a Passos, para que a doença do ad hominismo infetasse o combate político, banalizando as considerações sobre "o carácter", o percurso académico e até a família dos adversários.
Estamos a falar do partido cujo líder Marques Mendes pediu, em 2007, uma comissão independente para investigar a licenciatura de Sócrates (o qual, recorde-se, fez cinco anos de Engenharia em universidades públicas); que exigiu uma audição da ministra Lurdes Rodrigues para explicar a suspensão de um funcionário por supostamente ter feito uma piada insultuosa sobre o diploma do então PM, considerando, a priori, estar ante "uma atitude intimidatória, persecutória e opressora dos mais elementares direitos, liberdades e garantias." Um partido, enfim, especializado na calúnia, no insulto e na perseguição pessoal, cujo grupo parlamentar rejubila com menções "a licenciados de domingo" ou "discursos encomendados em cafés de Paris".
Num tal partido, a revelação da licenciatura "Novas Oportunidades" (ah, a suprema ironia - "certificação da ignorância", não era, senhor primeiro-ministro?) de Relvas deveria ter o efeito de uma bomba de tinta negra - tudo com a cara pintada de preto. Isto, claro, se face houvesse.
Nojo Permanente
29-6-2006 — Ao contrário de tanta gente que no passado recente acendeu tochas à menção da palavra "assessor" e agora ou está calada ou até, imagine-se, integra a assessoria de um ministério, acho que se trata de um trabalho como outro qualquer. E não alinho no culto de uma pretensa "pureza" dos jornalistas. Mas enquanto o jornalismo for, pelo menos formalmente, uma profissão com regras, convém que as regras façam sentido e sejam, pelo menos no mínimo, respeitadas.
Já aqui exprimi a minha estupefação com o facto de o Estatuto de Jornalista permitir a manutenção de carteira profissional a alguém que redige propaganda para uma publicação partidária. Um redator do Avante! ou do Ação Socialista não se distingue em nada (se distinção há é para pior) de um assessor de imprensa; no entanto, o Estatuto permite ao primeiro manter a carteira e ao segundo exige que a "entregue". Não faz sentido. Num e noutro caso estamos perante atividades em que se "vende" uma versão conveniente, não raro falsa, sem qualquer cuidado pela verificação factual e pela diversificação de fontes: a negação do jornalismo, portanto.
Esta injustiça relativa praticada pela lei com os assessores é compensada, porém, com o facto de a entrega da carteira profissional ser reversível. Ou seja: um jornalista pode durante uns tempos ser funcionário político e depois, quando lhe aprouver (ou quando o governo muda) regressar - de imediato - às redações. Num país em que se tende a exigir períodos de nojo cada vez mais alargados a ex-governantes, fazendo escândalo se algum surge, mesmo 10 anos depois, numa empresa remotamente ligada à área que tutelava (e mesmo quando não há ligação), o silêncio sobre a transumância entre redações e gabinetes ministeriais não pode deixar de ser encarado como um tabu corporativo e uma debilidade dos media.
Se há quem não se choque com a ideia da revelação forçada das relações privadas de jornalistas e considere mesmo que a existência de uma mera relação pessoal com um político os coloca sob suspeita insanável, como perceber que ninguém pareça preocupar-se com a identificação de autores de notícias como ex-assessores de imprensa ou adjuntos deste ou daquele ministro? Não terá o público "o direito de saber" que uma dada peça noticiosa foi assinada por quem ainda há uns meses estava na dependência hierárquica de um desses grandes malandros, os políticos?
A questão talvez se coloque ainda com mais acuidade ao contrário. De cada vez que um jornalista é nomeado por um governo, não deveremos olhar para toda a sua produção anterior à luz desse facto? E se o cargo em causa não tiver a mais remota relação com as suas competências curriculares, não é nosso dever, para além de confrontar um governo que garantiu a "total transparência" e "o fim dos boys", certificar que, doravante, se há pessoas com especial vocação para o spin partidário, este seja concretizado em panfletos ou gabinetes de comunicação e não em pretensas notícias?
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